terça-feira, 18 de maio de 2010

Os tempos verbais e seus propósitos

A questão das várias possibilidades do uso semântico dos tempos verbais e seus propósitos explícitos e implícitos faz lembrar, oportunamente, uma passagem bíblica do Livro de Eclesiastes (3:1-8) "tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu". Essa passagem poderia muito bem servir de abertura para uma discussão sobre o uso semântico dos verbos como um recurso indispensável para que o enunciador obtenha êxito comunicativo. Sabemos que as situações comunicativas apresentam nuances de intenção que ultrapassam a mera necessidade de marcar o tempo cronológico de uma ação: elas exigem do falante sensibilidade para perceber as circunstâncias que permeiam o ato da fala.
Há usos de tempos verbais reveladores mais de intenções do falante do que da definição de tempo. Observemos que, ao escolher o presente do indicativo para indicar um fato futuro, tempo presente associado a certas expressões ou outros tempos verbais, podemos denotar o desejo real de concretizar a ação em um prazo curto e certo: "À tarde envio-lhe a correspondência".
Podemos, ainda, denotar uma intenção escamoteada de que o fato possa não ocorrer: " Assim que eu puder, envio-lhe a correspondência."
A imprensa usa o presente do indicativo para indicar um evento no passado e faz isso para aproximar o leitor do fato: " Time vence com facilidade e encosta no líder". O recurso, conhecido como presente histórico ou narrativo, é também usado em livros didáticos: " Em 1822, o Brasil proclama sua independência".
Quando desejamos expressar polidez ou casualidade num pedido ou mesmo numa ordem, não raro abrimos mão do imperativo, substituindo-o pelo presente do indicativo ou então pelo futuro do pretérito: " Você traz um cafezinho para mim, por favor" ou "Você poderia trazer um cafezinho para mim, por favor".
Com o pretérito imperfeito do indicativo, há a possibilidade de produzir o mesmo efeito e acentuar a informalidade: " Você podia trazer um cafezinho para mim, por favor".
Esses usos semânticos tornam mais exato o efeito expressivo da mensagem e, principalmente, a intenção do falante. Além disso, o emprego desses tempos verbais gera no interlocutor uma resposta efetiva, pois permite perceber que mais do que o uso dos tempos e modos, as escolhas definem uma compreensão que pode estar nas entrelinhas.
Os vestibulares têm usado, cada vez mais, situações do cotidiano para formular questões envolvendo o uso semântico de tempos e modos verbais. É importante, pois, muita atenção na situação comunicativa apresentada para se chegar à resposta esperada.

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Inicial maiúscula ou não?

Pelo novo acordo ortográfico, os pontos cardeais não precisam mais de inicial maiúscula. Portanto, região norte, sul, nordeste etc. Assim como "estado", quando divisão territorial interna de países. Só se escreverá "Estado", com maiúscula, para conceituar país soberano, com estrutura própria e politicamente organizado ( o Estado brasileiro), ou o conjunto das instituições ( governo, forças armadas, funcionalismo público etc ) que controlam e administram uma nação ( a máquina política do Estado).
O Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa só confirmou a grafia estabelecida para essas palavras no acordo de 1943, o que alguns jornais e revistas ignoram, considerando importante manter "Estado", com maiúscula, ao se referir à divisão interna do país.
Parece-me uma preocupação desnecessária, já que é quase impossível alguém confundir "estado de Sergipe" com as várias acepções de estado. Por exemplo, " o estado da matéria" ou "o estado interessante daquela senhora", ou ainda "o estado lamentável daquele senhor".
É só estar atento ao contexto.

Quem sou eu

Mirian Rodrigues Braga é mestre e doutora em Língua Portuguesa pela PUC/SP. Especializou-se em analisar as obras de José Saramago. Em 1999, publicou A Concepção de Língua de Saramago: o confronto entre o dito e o escrito e também participou da coletânea José Saramago - uma homenagem, por ocasião da premiação do Nobel ao referido autor. Em 2001, publicou artigo na Revista SymposiuM da Universidade Católica de Pernambuco. Atuou como professora-assistente no Curso de Pós-Graduação lato sensu da PUC/SP. É professora de Língua Portuguesa e Redação no Ensino Médio e Curso Pré-Vestibular do Colégio Argumento.